sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Cirurgia íntima ganha campo, mas especialistas reclamam do preconceito

A falta de comunicação dificulta a adoção das técnicas
A falta de comunicação dificulta a adoção das técnicas
Pouquíssimo divulgada e rodeada de tabus, a estética íntima tem sido cada vez mais procurada - por mulheres, principalmente, mas também por homens. Para elas, há cirurgias de correção dos pequenos e grandes lábios vaginais, peeling para clarear a região perianal, preenchimento, minilifting na região do púbis e até implante capilar. Eles dispõem de cirurgia para redução da bolsa escrotal e para aumentar o pênis.

"Apesar da crescente procura, ninguém fica falando que fez", lembra o dermatologista Valcinir Bedin, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Estética. Existe tanto preconceito em torno desse tema que a divulgação ficou discreta, para evitar que seja motivo de piada. Por conta disso, muitas mulheres nem sequer imaginam que seu problema íntimo pode ser resolvido de forma simples e rápida.

O ginecologista e especialista em medicina estética Silvio Eduardo Valente diz que as mulheres não discutem essas questões nem durante suas consultas médicas, por mera vergonha. Em muitos casos, o incômodo acaba interferindo na vida sexual, por tornar a pessoa cada vez mais inibida durante a relação. "Todo mundo faz cirurgia plástica, aplica botox etc., mas muita gente acha a estética íntima meio ridícula", afirma Valente.

O procedimento mais procurado entre as mulheres, especialmente entre aquelas na faixa dos 30 e 45 anos, é a correção dos pequenos lábios vaginais, a ninfoplastia. Por serem hipertrofiados - ou seja, maiores - e ficarem para fora da genitália, acabam machucando com o contato da roupa, e até fazendo volume, quando a mulher veste biquíni, por exemplo.

O cirurgião plástico Marcelo Assis cita o caso de uma garota de 17 anos que fez ninfoplastia com o aval de seu ginecologista, pois os pequenos lábios fechavam a vagina e impediam a "respiração" - motivo pelo qual ela vivia com infecções. "As mulheres não sabem que se trata de procedimento simples, que não acarreta dor", explica Assis. "Por ser em região de mucosa, a cicatrização é mais rápida e leva de 20 a 25 dias para a paciente ter alta."

Muitas ficam sabendo da opção "íntima" por acaso, quando vão realizar alguma cirurgia plástica tradicional. A empresária Raquel (pseudônimo), de 43 anos, estava conversando com sua cirurgiã, quando, sem querer, comentou sobre o seu problema nos pequenos lábios vaginais. Foi então que sua médica lhe disse que a ninfoplastia era um procedimento comum, e ela não hesitou em acrescentar essa cirurgia no pacote, já que faria uma plástica nas pálpebras.

"O atrito com a calcinha e absorvente era horrível, e também atrapalhava na hora da penetração, embora meu marido nunca tivesse reclamado", conta Raquel. "Tinha vergonha de ficar nua até na frente das minhas filhas, que caçoavam de mim. Fingia que não ligava, mas no fundo era muito constrangedor. Nunca comentei nada com ninguém, nem com meu ginecologista. A melhor coisa que fiz foi ter corrigido com a cirurgia."

Sem motivo
O cirurgião plástico Munir Curi, um dos precursores da estética íntima no Brasil, acredita, porém, que uma parcela dos pedidos de cirurgias desse tipo está relacionada ao que ele chama de "deformidade imaginária". "Existem casos em que realmente não há necessidade alguma, então me recuso a fazer", afirma.

Curi e o dermatologista Bedin executam também transplante pubiano. Enquanto tem gente que faz de tudo para tirar os pêlos, há quem se incomode com a falta deles. Segundo os especialistas, esse pedido é geralmente feito por mulheres com mais de 60 anos, que, por causa da queda no nível hormonal, acabam perdendo-os.


Os homens não ficam atrás e, mesmo com o preconceito elevado à enésima potência, acabam recorrendo a correções estéticas. A mais procurada, inclusive pelos mais novos, é a minilipoaspiração de púbis - procedimento também usado em mulheres. Ao retirar o excesso de gordura local, o volume diminui. No caso de púbis alto, outra opção é fazer lifting, que geralmente está associado à cirurgia do abdome.

Há quem queira reduzir a bolsa escrotal. Segundo o médico Assis, o excesso está relacionado à idade avançada, fase em que se perde colágeno e a pele fica flácida. No entanto, a cirurgia mais polêmica é a de alongamento do pênis. "Com a presença de um urologista, se faz a liberação dos ligamentos laterais para se ganhar até três centímetros no comprimento, sem que isso afete o desempenho sexual", diz.

No consultório

Fora as cirurgias, existem técnicas que não necessitam de anestesia nem cortes. Assim como os homens perdem o colágeno, causando flacidez na bolsa escrotal, as mulheres sofrem desse mesmo problema. Para isso, há preenchimento nos lábios vaginais. É feito com a aplicação de ácido hialurônico - o mesmo utilizado na boca e rugas do rosto - ou até com a gordura do próprio corpo. Por ser absorvido pelo organismo, o efeito dura, em média, seis meses.

O peeling perianal e perivulvar é outra técnica que também passou a ser usada na estética íntima. A região genital é mais escura, por existirem mais células de melanina, mas a partir dos 50 anos a queda hormonal pode piorar o quadro, explica o dermatologista Bedin. "Para isso, são feitas cerca de três aplicações de uma pasta abrasiva, que ajuda a clarear, além de estimular a produção de colágeno, renovando a pele."

A perineoplastia tem sido a opção para mulheres que reclamam do afrouxamento vaginal após o parto normal. "Muitas vezes envolve o reforço da musculatura do períneo e da região vaginal, para que se recupere o prazer sexual", avisa o ginecologista Valente, que vai apresentar em junho uma nova técnica de cirurgia íntima no Congresso Brasileiro de Medicina Estética.

Entre todas as alternativas, as únicas rechaçadas pelos especialistas é a reconstituição do hímen e aplicação de ácido hialurônico no pênis para aumentá-lo. No primeiro caso, além de o procedimento ser proibido pelo Conselho Federal de Medicina, é considerado uma fraude e, portanto, uma questão de ética. Mas a própria cirurgia é contraindicada.

O cirurgião Assis explica que o procedimento é invasivo e pode causar problemas no futuro. "É necessário descolar uma camada de pele dos pequenos lábios, como se fosse um retalho. Só que, na cicatrização, se forma fibrose, que dificulta o rompimento durante a relação sexual, causando dor e muito sangramento. Depois, essa pele fica solta e precisa ser removida para não acumular sujeira e infeccionar."

Já a aplicação de ácido hialurônico, com a intenção de aumentar o tamanho do pênis, pode causar impotência nos homens, pois a substância é injetada no bulbo cavernoso, responsável pela ereção. "Isso é loucura", alerta Assis.